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Mário e o livro de piratas

Este rapaz vai longe

A moeda do Sol

 
 
Mário e o livro de piratas
Autores: Timothy Knapman e Adam Stower
Editora: Asa
 

  É importante percebermos, quando entramos no mundo das histórias, que elas, na prática, se resumem a um número muito escasso, a partir do qual se tem vindo a criar, ao longo dos tempos, uma quantidade infindável de variantes. E é na capacidade de tornar original e atractiva cada variante, como se fosse a primeira vez que ouvíamos ou líamos uma história sobre aquele tema, que está a genialidade de um contador ou de um escritor.

  Genialidade será um termo excessivo no caso em apreço, mas este é, seguramente, um livro muito interessante, lúdico e divertido. Mário e o livro dos piratas começa por contar uma história que nos agarra pela ironia das ilustrações e do grafismo pouco convencional mas muito dinâmico, em contraponto a um enredo banal, tão previsível e novelesco (no mau sentido televisivo) que damos por nós a duvidar da qualidade da obra. Mas tudo se altera quando o pequeno Mário pede à mãe para a contar pela sexta vez! Aqui, começamos a sentir alguma coisa de familiar…

  A mãe, todavia, não cede, e dá a Mário a oportunidade de ser ele próprio a fazer a leitura. E é então que sucede o inesperado: as personagens ganham vida própria, o herói abandona mesmo o livro dos piratas em troca de um outro mais sossegado, e Mário vê-se na contingência de ter que mergulhar ele próprio no seu livro favorito para que a história não tenha um final desagradável. Com a imaginação à solta, a segunda parte do conto transforma o nosso pequeno leitor no novo herói, continuando a desfiar um enredo banal mas que, pelo absurdo de ter como protagonista um menino de pijama com o seu ursinho pela mão num barco de piratas, se transforma em algo de fascinante.

  Não foi isto mesmo que fizeram os surrealistas tantas vezes (vejam-se casos geniais em Portugal como Cesariny, O’Neil e Mário Henrique-Leiria), num registo para adultos? Quanto a este livro, é para ser lido preferencialmente com o nosso filho ao colo, atento às imagens, tentando nós dar às palavras a ênfase necessária para que ele lhes consiga beber toda a ironia.

 
Nuno Garcia Lopes
::topo::
 
 
Este rapaz vai longe
Texto: António Torrado
Ilustrações: Cristina Malaquias
Editora: Campo das Letras
 

  Por este mês, aqui no Contador, estamos orgulhosos. Faz cem anos dia 17 que nasceu um dos homens de cultura mais importantes do século XX português, Fernando Lopes-Graça, nosso conterrâneo, exactamente no mesmo dia em que a nossa avó (minha e do Filipe).

  Entre os inúmeros actos comemorativos que se têm vindo a desenrolar pelo país (e de que merecem natural destaque os da nossa Tomar natal), está em cena no Teatro Nacional D. Maria II a peça “A casa da lenha”, encenada pelo também nabantino João Mota, a partir de um texto do António Torrado que, não o sendo de nascimento, nos diz sempre sentir-se aqui como em casa.

  Foi na sequência desse texto que Torrado escreveu Este rapaz vai longe – Fernando Lopes-Graça quando jovem agora editado pela Campo das Letras com ilustrações de Cristina Malaquias na colecção infantil O Sol e a Lua.
Para quem está habituado à imaginação prodigiosa do autor e ao requinte com que nos confecciona deliciosos pratos temperados com os melhores condimentos da Língua Portuguesa, esta pequena narrativa baseada em factos reais pode talvez saber a pouco.

  A verdade, porém, é que traça um retrato apetitoso, com uma pitada qb de acção e mistério, de um menino talvez não tão precocemente prodigioso como Mozart mas que, se bem o souberem enrolar nos papelinhos de rebuçado, tem uma vida tão intensa, heróica e fascinante que em nada fica a dever à do compositor de Salzburgo, prolificamente imortalizado em chocolates.

  António Torrado já cumpriu a sua parte – que venha agora quem ponha a música a tocar, com o mesmo savoir faire, nos nossos ouvidos.

 
Nuno Garcia Lopes
::topo::
 
 
A moeda do Sol
Texto: Mário Castrim
Ilustrações: João Caetano
Editora: Campo das Letras
 

  Mário Castrim, que muitos reconhecem apenas como talentoso crítico de televisão, deixou-nos também um importante legado de textos dedicados à infância. Parte deles, em poesia, foram agora coligidos pela Campo das Letras com o título genérico A moeda do Sol e acompanhados de ilustrações de João Caetano.

 São textos essenciais que devem fazer parte da biblioteca de qualquer professor do 1º ciclo, dada a sua importância numa área em que são escassos os autores portugueses a escrever com qualidade: a poesia para crianças. Mas atenção: fazer parte da biblioteca pessoal não significa que devam usar e abusar destes textos antes de criarem nos vossos alunos uma competência para a leitura de poesia, que terá vantagens em começar pelas lengalengas e trava-línguas, prosseguindo com autores mais “fáceis”, onde a musicalidade é mais evidente e as imagens (muitas vezes pela hipérbole ou pelo absurdo) mais assimiláveis, como são os casos de Luísa Ducla Soares ou algum António Torrado, por exemplo.

 Como acontece com toda a boa poesia, querer impingi-la a quem não está preparado para a entender resultará em perder leitores em vez de os ganhar.

  “Ao fim da tarde / uma rodela de sol / ficou na ponta da pedra mais alta. // Lancei-me a correr / a ver se apanhava / a moeda de ouro. // Mas quando lá cheguei / já a noite a tinha guardado no bolso do capote / para comprar / o dia seguinte.”

 Este é o poema que dá título ao livro. Esta é a linguagem de Castrim. A riqueza semântica é imensa. Mas certifiquem-se primeiro que todos os meninos já viveram (reparem no verbo: não é viram, é viveram) toda a intensidade poética de um pôr-do-sol. Do talento de João Caetano falam os livros que tem assinado como ilustrador. O presente caso é uma autêntica viagem, plasticamente fascinante, um outro livro de poemas dentro deste livro.
Porém, há aqui uma falha grave, infelizmente recorrente nos dias de hoje: sendo antes de mais um livro de poemas para crianças, a opção pela sobreposição dos textos às ilustrações, quase sempre com texturas muito intensas, provoca grandes dificuldades de leitura.

 Eu próprio, leitor compulsivo, me vi bastas vezes entediado com a dificuldade de entender os signos que tanto me agradam. O que dizer, então, de uma criança recém chegada ao fabuloso mundo da decifração da escrita, dando de caras com palavras desconhecidas, algumas nem sequer disponíveis no dicionário, que se confundem com a mancha de cor do fundo da página?

  Voltamos ao mesmo: dar a quem está a tentar ser desperto para o prazer da poesia um livro que é penoso de ler resultará em perder leitores em vez de os ganhar. E é pena, porque A moeda do Sol é um texto de grande qualidade, acompanhado por ilustrações de qualidade (até poética) nada inferior, e publicado por uma editora que não se tem rendido à tentação de pôr nos escaparates livros para crianças de qualidade duvidosa e lucro fácil.

 
Nuno Garcia Lopes
::topo::